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O visitante de Porto Acre não pode perceber à primeira vista a importância desta cidade. Aos olhos do viajante, Porto Acre parece mais uma vila de poucos moradores, pacata e lenta como só as cidades do interior sabem ser. Mas, sob as aparências, refletidas nos olhos de quem acaba de chegar, existe um lugar que resistiu ao tempo, como seus fundadores resistiram aos conflitos para aqui ficar. Afinal de contas, a história do Acre começou aqui.

É verdade que existem no Acre outras cidades mais antigas, como Rio Branco e Xapuri, mas quando esses povoados foram criados às margens do rio Aquiri, sequer existia um lugar chamado Acre. Por isso o patrimônio histórico de Porto Acre é um dos mais significativos do Estado, apesar de toda a destruição aparente causada pelo tempo e pelos homens.

Só umas poucas casas de arquitetura mais tradicional, resistem nas ruas de Porto Acre. Ainda assim, essas duas ou três residências são evidentemente bem mais recentes que toda a história que fez a fama, o nome e a existência dessa cidade.

Do mesmo modo, poucos habitantes dali guardam a memória de tudo que passou entre aqueles barrancos altos. Já lá se vai muito tempo desde que tudo aconteceu. Os revolucionários que não morreram de bala durante a guerra, morreram de morte morrida. Seus filhos, também já se foram e seus netos estão por ai espalhados pelo mundo. Nada que não seja normal nesse país de solene e reconhecida falta de memória.

Mas nada disso importa. O patrimônio de Porto Acre é de uma natureza diferente da maioria dos lugares que se tornaram conhecidos por seus conjuntos arquitetônicos raros e ricos. Ele está ali, diante dos que não sabem vê-lo.

O patrimônio histórico e cultural de Porto Acre é sua própria paisagem. O alto do barranco está ali, a curva e o estirão do rio estão ali, pode-se quase ver a corrente atravessada de uma margem à outra impedindo a passagem do inimigo. O patrimônio de Porto Acre está no interior das casas e sob a terra na forma de objetos, garrafas, pequenas letras de chumbo já encontradas ou por encontrar ainda. Todos os meninos dessa cidade acham os tesouros de um passado distante que sabem muito antigo, mas não sabem avaliar quanto. Sabem também os meninos que aqueles tesouros não valem dinheiro, quando muito valem um cupom na rifa de Seu Artur, ou uma conversa bem contada que os encha de glórias e orgulhos momentâneos. Sentem os meninos que apesar de não ter valor em dinheiro, os tesouros de Porto Acre valem muito e brincam indiferentes ao passar do tempo.

Não, Porto Acre, não está esquecida. Porto Acre não esqueceu de si mesma. Pode-se dizer, talvez, que adormeceu num sono profundo e longo, mas desperta um pouco cada vez que revela seus pedaços de história ocultos.

Não, Porto Acre, não é uma cidade fácil de ser conhecida. É preciso, porém, conhece-la. Não como a conhecem os velhos de memória antiga, mas como a conhecem os meninos que pulam o barranco em facadas primorosas rumo às águas barrentas e que, no final da tarde, vêem o rio do alto do barranco e se lembram do que sempre sentiram, que aqui começa o Acre.

Uma vez passado o porto, uma porta se abre e se sabe, chegamos ao Acre.

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